comentário literatura e cinema

Emma, Jane Austen

Antes de mais nada, só queria comentar que mudei o cabeçalho ontem, com um pedacinho de uma foto que eu tirei há alguns meses. Adoro foco super macro, confesso.

Agora, ao que interessa. Jane Austen escreveu romances sobre mulheres, basicamente. E eu não culpo a maioria maciça dos homens por não gostar do que ela escreve, que é basicamente sobre senhoritas tentando arrumar um marido rico e que elas amem – porque as heroínas da Jane Austen só se casam por amor, embora maravilhosamente o amor seja rico na Inglaterra do século XVIII. Mas talvez vocês já possam desconfiar que tem algo por trás de tanta caçação de macho se eu disser que a própria autora nunca se casou, embora o casamento esteja em toda a parte de sua obra.

Desde que assisti um filminho chamado “The Jane Austen Book Club”, resolvi tentar fazer o mesmo dos personagens e ler todos os romances da Austen. Bem, eu já tinha lido Pride and Prejudice havia mais de um ano, então o mais legal de todos já estava descartado. De qualquer maneira, passei na biblioteca da FALE e peguei os que sobraram, pra trazer pra roça. Volto em dois dias e só li um deles. A meu favor, digo que antes li os livros que peguei emprestado com uma amiga, e comprei mais um, então não me persigam, ainda tem um mês inteiro de férias.

O caso é que esse primeiro romance que terminei é Emma. Eu o escolhi pra começar porque sabia que Emma é o que chamam em inglês de matchmaker, e que isso foi precursor de mil histórias de casamenteiros que não sabem cuidar das próprias vidas amorosas. Sim, você aí pensou no filme do Will Smith, né? Ok, o pop está em todos nós, entra na cabeça mesmo que a gente não queira. Tá de boa, pensei no mesmo. E GOSTARIA DE DEIXAR CLARO QUE TEM SPOILERS ABAIXO, OU SEJA, VOU CONTAR O FINAL! Estejam avisados.

O primeiro parágrafo já deixa claro que Emma Woodhouse é rica, bonita, e fora a morte da mãe quando era criança, não teve nada de relevante para entristecê-la: o sentido normal das coisas é cumprir a vontade dela. Emma tem 21 anos, cuida da casa desde jovem, porque a irmã se casou e se mudou, e ela se torna a única companhia do pai, que já está bem velho, quando sua governanta se casa. De acordo com Emma, o próprio casamento seria um arranjo dela.

Eu desenrolei o que acontece no primeiro capítulo. Emma resolve fazer amizade com a tal Harriet Smith, que é pobre e não sabe quem é sua família natural, (the natural daughter of nobody) e se empenha durante todo o livro para arrumar um marido para a amiga. Seu melhor amigo, irmão do cunhado e dono da mansão vizinha, Mr. Knightley, a censura desde o princípio por colocar idéias em Harriet que não condizem com seu lugar na sociedade.

De ler isso, parece que o Knightley é vilão. O caso é, NÃO; todos os personagens, unanimemente, concordam, ainda que silenciosamente, que o dinheiro dita quem pode se relacionar de qual maneira com quem, especialmente com relação a casamentos. Muitos são por dinheiro sim. Mas você acaba compreendendo que o casamento entre pessoas com diferenças econômicas acaba sendo muito improvável porque ricos e pobres simplesmente não se encontram, não se conhecem, e mesmo quando isso acontece, a diferença fica presente, como na cena em que Emma vai fazer sopa para uma família muito pobre e Harriet a acompanha. Isso fica mais forte ainda na adaptação para o cinema de 1996, que tem a Gwyneth Paltrow no papel principal.

Gwyneth Paltrow como Emma Woodhouse, em 1996

Alguém muito mal educado fez anotações violentas no livro em que eu estava lendo, e como sou curiosa do jeito ruim, li uma parte que falava sobre Emma ser uma comédia dos erros. As dicas para o que realmente acontece à volta de Emma estão lá o tempo todo: você vê Mr. Elton dando em cima dela o tempo todo, e não de Harriet. Você vê que depois ela não se apega ao Frank Churchill, mesmo que a Emma já tenha percebido que não gostou dele realmente. E a essa altura você já começa a prestar muita atenção no Knightley falando: “Brother and sister? No, indeed!”, se referindo a Emma. Porém, ela simplesmente não vê. “Eu pareço condenada à cegueira”, ela confessa a ele, quando, no fim do livro, os dois finalmente se declaram mutuamente.

E como tudo dá errado nas previsões da Emma, o que estaria errado nesse momento maravilhoso? Hã? Harriet Smith tinha confessado amar Knightley, dias atrás! Aiai… Sim, tudo dá errado pra Emma, mas pra aquecer o coração da gente, ela acaba se dando bem no final, casando com Knightley e tudo o mais.  Engraçados esses finais felizes da Austen, porque ela própria não foi assim. E outra coisa: os dois galãs que eu já vi dela são meio rudes. Será que ela, como eu, desconfia dos bonzinhos demais? Sei lá, vai ver ela entende uma certa hipocrisia em bons modos eternos. Enquanto Emma tenta mascarar sua desaprovação da Mrs. Elton, Knightley nunca finge gostar de Frank Churchill – mais por ciúmes, mas ainda assim.

Outra coisa: vale questionar as relações secretas a partir desse romance. Confesso que não imaginei o noivado secreto da Jane Fairfax com Frank, já que ele gastou tanto tempo falando mal dela pra Emma e dando em cima da Emma tão violentamente!

Bom, o que vale dizer é que o livro tem trechos maçantes, mas acaba sendo ótimo, e te prende. Só mais um paralelo com Pride and Prejudice: os dois, Darcy e Knightley, tem uma frase de impacto, romântica, que me derreteram e me fizeram virar uma mulherzinha boba suspirando pelo príncipe encantado. Eu sempre quis ouvir o Darcy falando pra mim: “I love you. Most ardently.” Sem falar que no filme ficou ainda melhor! O Knightley, por outro lado, diz  “I cannot make speeches, Emma. If I loved you less, I might be able to talk about it more”. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhh.

Sobre as adaptações: vi duas. Uma pra TV, muito mais ou menos, deletei assim que vi. Mas achei que ela acertou em coisas que a adaptação pro cinema errou. O Mr Knightley da TV era mais rude, mais durão, enquanto o do cinema era um pouco príncipe encantado demais. A Harriet da TV também parecia mais a menina inocente e boba, embora a atuação da Tony Collete pra cinema seja muito boa (mas eu confesso que mesmo que não fosse boa eu gostaria, afinal a Tony Collete é mãe da Little Miss Sunshine! hahaha.) A Emma-Paltrow é muito boazinha, a Emma-TV (esqueci o nome) é malvada demais. A fotografia e montagem pra TV são horríveis, as do cinema são melhores. A Miss Bates pra cinema é ótima, e irritante como a do livro. Aliás, PUTS! Eu pulava a maior parte das coisas que a Miss Bates fala no livro, porque a fala dela sempre terminava na página seguinte, quando saía algo de interessante…

Mas então, é isso, eu recomendo. É uma leitura que exige paciência, e compreensão, o ato de tentar pensar como as pessoas daquele contexto, porque a nossa vida é loucamente diferente hoje. Qualquer generalização que fiz sobre toda a obra que estiver errada e apenas diga respeito aos dois romances que eu li, perdão desde já.

Gente, mil e duzentas palavras! Isso podia ser um essay pra faculdade! Agora é só esperar eu fazer uma matéria que leia esse livro…